Avaliação individualizada do candidato a tomador de recurso permite que instituições liberem recursos para quem não acessa o sistema financeiro tradicional
Instituições especializadas em microfinanças espalhadas por todo o País se consolidam como alternativa de crédito para empreendedores informais que não conseguem acessar o mercado financeiro tradicional. A metodologia própria de análise da situação financeira de cada tomador de recursos possibilita que essas organizações apoiem negócios de micro e pequeno porte sem sofrer com altas taxas de inadimplência, que poderiam comprometer a sustentabilidade da financiadora, e sem a necessidade de juros excessivamente altos, que tornaram inviável o negócio do empresário. Em 2024, integrantes da Associação Brasileira de Entidades Operadoras de Microcrédito e Microfinanças (ABCRED) liberaram R$ 1,22 bilhão em financiamentos, um crescimento de 20% em comparação com o ano anterior.
A maior parte dos recursos foi destinada ao empreendedorismo – e em especial aos empresários do setor informal. Segundo levantamento da ABCRED, os informais representam 65% dos 155 mil clientes das instituições de microfinanças associadas. Presidente da entidade, Isabel Baggio explica o impacto desse tipo de financiamento. “Imagine uma fabricante de doces caseiros que conquistou uma clientela na vizinhança, mas está com a capacidade de produção limitada pela falta de um equipamento qualquer – um novo forno, por exemplo. Informal, ela terá dificuldade para conseguir recursos em bancos tradicionais. Uma instituição de microfinanças vai avaliar a situação da empreendedora e liberar o financiamento para a compra do equipamento, desde que a operação aumente a receita da empreendedora e tenha impacto positivo no seu orçamento. Ao investir e crescer, ela pode deixar a informalidade e até vir a gerar novos empregos”.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE mostram que há retração no número de informais no País. Pelos números mais recentes, pouco mais de 38% dos trabalhadores brasileiros não têm CNPJ ou carteira assinada – um total de 39,5 mihões de pessoas. “É um contingente enorme de pessoas que precisam de apoio para empreender”, diz Isabel Baggio. A busca desse público por recursos cresceu no ano passado. Em 2023 eles eram 59% dos 146 mil clientes das instituições associadas à ABCRED. Em apenas um ano, cresceu em mais de 14 mil o número de empreendedores informais que buscaram recursos. “Facilmente podemos multiplicar esse número por quatro para avaliar quantas pessoas foram efetivamente beneficiadas, já que o impacto de geração de renda é sentido diretamente pelas famílias”, diz a presidente da associação. Os dados da entidade mostram que três em cada quatro tomadores de crédito tem renda de até 3 salários mínimos.
A avaliação do perfil de quem pede o recurso é o grande diferencial das operações de microfinanças. Em vez de usar cadastros e escores, como o mercado tradicional, as instituições trabalham com equipes treinadas para analisar a situação de cada candidato a tomar um empréstimo. Consultores de crédito – a maioria mulheres – fazem visitas e um diagnóstico financeiro de quem pede o recurso. A partir daí é tomada a decisão de liberar ou não o financiamento. “A ideia é garantir que a pessoa colha os benefícios do recurso sem comprometer a estabilidade do seu orçamento”, diz Isabel Baggio. A análise individualizada – e a criação de relações de confiança com o empreendedor – também reduz a necessidade de garantias. A inadimplência entre as integrantes da ABCRED ficou em 2,8% no ano passado.
O chamado microcrédito produtivo é o carro chefe das liberações. De cada R$ 100 financiados, R$ 85 foram para negócios – capital de giro ou investimentos. Nos últimos anos, porém, é crescente a demanda por recursos que melhoram outras a vida das pessoas para além do trabalho.
Em 2024 as associadas à ABCRED liberaram mais de R$ 45 milhões para reforma de casas, R$ 15,3 milhões para investimentos em pequenas propriedades rurais, R$ 5,6 milhões para saneamento básico domiciliar (compra de caixa d’água, construção de fossa séptica, entre outras melhorias) e R$ 5,2 milhões para projetos de implantação de energia solar.